Os filhos do 25 de abril foram a primeira geração a crescer num ambiente de descompressão, com liberdade de expressão, sem o espectro de ter de ir à guerra colonial, e já sem a tensão política e social dos primeiros anos após a Revolução. Apesar da crise financeira do Estado, que obrigou às intervenções do FMI em 1977 e 1983, a classe média procurava reproduzir os padrões de consumo das sociedades europeias mais avançadas: surgiram os centros comerciais e hipermercados, generalizou-se o acesso a equipamentos domésticos, como os televisores e os micro-ondas, e democratizaram-se as opções de lazer e cultura.
Por outro lado, esta foi talvez a última geração de crianças com liberdade de movimentos, habituadas a ir sozinhas para a escola desde cedo. Pelo contrário, os pais de hoje, crianças de então, já não abdicam de levar de carro os filhos à escola e às mil e uma atividades, enquanto recordam com saudade os tempos em que passavam as tardes a brincar na rua com os vizinhos, sem controlo parental, correndo grandes perigos, como o Dartacão (leia-se: tocar às campainhas e fugir).
Em casa, o ecrã da televisão servia para dois propósitos: para ver os desenhos animados, servidos em doses moderadas nas tardes de semana e nas manhãs de fim-de-semana, e as novelas e concursos ao serão, em família; ou para jogar nas vetustas consolas Atari ou ZX Spectrum (load aspas aspas enter play, lembram-se?). Jogos que eram muitas vezes um pretexto para ir a casa de amigos, ou não fosse esta geração mais gregária do que as seguintes.
Na música, surgiu um nicho de mercado infantil, protagonizado por Ana Faria e os Queijinhos Frescos, os Ministars e os Ondachoc. Mas mesmo os mais novos ouviam também o pop-rock português que cresceu em força nos anos 80, com a ascensão de nomes como Rui Veloso, Xutos & Pontapés, Heróis do Mar, Táxi e UHF, e o auge das carreiras de artistas como Lena d’Água ou os Trovante (aliás, o Trovante, como preferem ser chamados).
https://observador.pt/especiais/por-que-gostamos-tanto-dos-anos-80/
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