James Stewart é hoje reconhecido como um dos maiores actores de todos os tempos. No entanto, durante os seus mais de 30 anos de carreira ele nunca foi visto como uma estrela. Foi sempre uma pessoa humilde e resoluta, muito semelhante às personagens que representou. Não havia homem mais digno para abrir a rúbrica Hall of Fame.
Nascido na pequena cidade de Indiana a 20 de Maio de 1908, James Stewart viria a ser uma das maiores lendas do cinema americano.
Mas na sua juventude estava longe de o saber. Gostava de brincar como mágico, e cedo pensou que a sua vocação era a arquitectura. Foi então estudar para Princeton, uma das mais reputadas faculdadades norte-americanas. Lá conheceu Joshua Logan, mais tarde realizador de vários filmes de sucesso entre os quais estão Picnic e Bus Stop, que o convenceu a juntar-se à University Players. Lá descobriu muitos dos grandes talentos da sua geração e começou uma amizade que duraria até à morte com Henry Fonda.
Margaret Sullavan, mulher de Fonda, deu-lhe o primeiro empurrão para entrar no cinema onde Stewart começou por fazer papeis em musicais e vaudeville. No entanto o seu jeito algo desengonçado de rapaz honesto de provincia vinha mesmo a calhar num período em que, fruto do New Deal, era importante recuperar a auto-estima do americano comum, que encontrava no cinema o escape de uma vida de tristeza.
Foi assim que começou, de um momento para o outro, a relação mais espantosa que o cinema já conheceu entre um realizador e um actor. Frank Capra, à altura presidente da Academia e conceituado realizador viu em Stewart o seu molde de homem: honesto, capaz de suportar com todos os problemas, ajudar os amigos e mesmo assim sair vencedor no final.
Em 1938 Stewart consegue o seu primeiro papel de destaque em You Can´t Take It With You. No filme Stewart era o filho honesto de um milionário sem escrúpulos, e acaba por apaixonar-se por uma rapariga pobre de uma família um pouco "alternativa". A notável interpretação, se bem que ainda secundária, recebeu elogios de todos os lados. Capra gostou do que viu e lançou-o às feras no ano seguinte no seu Mr Smith Goes To Washington. Neste belo filme, um dos melhores de sempre, Stewart é mágica na forma como dá vida a Jefferson Smith, um jovem idealista que se torna congressista apenas por ser vist pelo manda-chuva do seu distrito como alguém fácil de domar. No entanto, com a ajuda da sua secretária, o jovem congressista consegue perceber a podridão que se tinha instalado em Washington. O filme arrebatador num duelo um contra todos que ficou para a história, consagrou definitivamente Stewart, que nesse ano ganhou vários prémios pela sua interpretação. Na cerimónia dos óscares era o grande favorito mas a vitória acabou por sorrir a Robert Donat. Injustamente clamaram todos.
De uma forma ou outra a sua carreira estava lançada. As suas personagens, que eram quase o reflexo da sua forma de estar, cativavam o público. Foi assim em The Shop Around the Corner de Ernst Lubitsch e em Philadelphia Story, ao lado de uma dupla de luxo: Cary Grant e Khatarine Hepburn. A Academia, como recompensa pelo óscar perdido em Mr. Smith, declarou-o vencedor, num ano em que Stewart afirmou que deveria ter sido o seu amigo de sempre, Henry Fonda, a triunfar.
Quando a 2º Guerra Mundial chegou aos EUA, Stewart foi o primeiro actor a alistar-se. Era tão amado que o exército recusou a inscrição por ter medo que algo lhe acontecesse. James foi teimoso e conseguiu fazer parte das hostes Aliados. Durante a 2º Guerra foi um exemplo de comando e liderou várias missões com grande sucesso. Acabou a guerra no posto de tenente-coronel, e conquistou a estima de todos os soldados.
Quando voltou a Hollywood, em 1945, tudo tinha mudado. As personagens que agora cativavam o público eram duras e cínicas, inspiradas no modelo imposto por Humphrey Bogart. Parecia já não haver espaço para os homens honestos e cheios de principios que Stewart normalmente encarnava.
Mesmo assim, foi dele quem Frank Capra se lembrou (como conta deliciosamente na sua biografia O Nome Sobre O Título), para o papel principal em It´s a Wonderful Life. Stewart aceitou de imediato e viveu aqui a sua maior personagem, naquela que ficará para a história como a maior personagem de sempre: George Bailey.
Neste filme, puramente capriano, Stewart foi sublime na pele de um homem que abdica de tudo em prole dos outros, e que, quando perde a vontade de viver, tem a possibilidade de ver como seria o mundo se nunca tivesse nascido. Num filme que é um hino à poesia cinematográfica, James Stewart conseguiu a melhor interpretação da sua carreira. Só que o público parecia não ir em contos de fadas e It´s a Wonderful Life foi o maior falhanço do ano. Seria mais tarde ressuscitado pela televisão e hoje é um dos titulos mais aclamados de sempre.
Foi o canto do cisne para Frank Capra, mas não para Stewart. O actor, agora com 40 anos, percebeu que se o público tinha mudado, então também ele deveria mudar.
Começou então a promover alterações nas personagens que escolhia. Do tipico americano honesto passou a desempenhar papeis de homens duros, cinicos, mas com um bom coração que no final os levava pelo caminho certo
Seguindo esta nova abordagem, começou a sua associação com outro mestre do cinema, Alfred Hitchock. Em 1948 brilhou no filme Rope. Voltaria a trabalhar com o mestre do suspense mais três vezes. Mas lá chegaremos.
Em 1948 casa com Gloria Hatrick McLean e decide passar a negociar os contractos com uma percentagem dos lucros dos filmes em que entra. Isso provou ser uma boa medida porque até meados dos anos 60 todos os filmes em que entrou provaram ser um sucesso.
No início da década de 50 o novo Stewart provou ser tão cativante como o antigo. Em Harvey consegue mais uma nomeação ao óscar, e no mesmo ano protagoniza Winchester 73. Seria o seu primeiro western ao lado de Antonhy Mann. Em 1953 seria a estrela do notável Naked Spur e três anos depois protagonizaria The Man From Laramie. Stewart continuou a fazer westerns mas desta feita ao lado de John Ford que viu nele o complemente perfeito para John Wayne. Em 1962 Ford conseguiu um dos seus melhores filmes com esta dupla de actores em The Man Who Shot Liberty Valance. Ganharia mais uma nomeação ao óscar, a sua 7º e última.
Pelo meio tinham ficado três obras-primas ao lado de Hitchcock, em Rear Window, The Man Who Knew To Much e acima de tudo Vertigo, uma das maiores obras primas do cinema. Aí Stewart iria representar ao nível da perfeição e seria elevado a estrela pelo grupo francês do Cahiers do Cinema, à época num processo de revalorização de estrelas do cinema americano deixadas de lado pelo star-system. Stewart, que nunca mais voltou a vencer um óscar, apesa de por três vezes ter sido o melhor do ano, viu assim o seu talento ser reconhecido do outro lado do oceano.
Mas para o Stewart homem isso não era relevante. A importância que dava a prémios era tal que, depois de em 1940 ter recebido o óscar, o enviou para o pai em Indiana que a expôs na sua barbearia. E aí continuaria até à morte do pai do actor.
Jimmy Stewart começou a deixar o cinema nos anos 60, logo após Liberty Valance. Voltaria em ocasionais papeis mas nunca orquestrou um "come back" como muitos actores fizeram. Viveu a sua vida tranquilamente com a sua esposa e os seus dois filhos (a mulher tinha dois filhos de um casamento anterior e foi a morte de um, no Vietname, que mais marcou a vida de Stewart depois de ter deixado o cinema), e manteve-se como um exemplo de humildade, coragem e integridade.
Quando Gloria Stewart faleceu em 1994, a sua vida começou a deixar de fazer sentido. Jimmy estava a ficar doente e, sem a companheira de sempre perdia a vontade de lutar. Finalmente, no Natal de 1997, o cancro derrotou-o e tirou ao mundo um dos seus maiores vultos.
James Stewart como actor foi um exemplo a seguir. Os seus papeis marcaram a letras de ouro a história do cinema. Mas o James Stewart homem ficará bem mais presente na mente dos homens. A humildade e a sua forma de encarar a vida eram e serão sempre, o exemplo a seguir.