1976 - O cantor António Garcez e o baixista e vocalista Sérgio Castro decidem fundar os Arte & Oficio. Dois músicos experientes: Garcez brilhara no primeiro Vilar de Mouros, em 1971, à frente do Psico, cuja formação Sérgio Castro integra a partir de 1974.
Do Psico vêm ainda Juca, teclas, que abandonará o grupo antes do fim do ano, e Serginho, por oposição ao Serjão, Sérgio Castro, nas guitarras. Ao longo da primeira metade dos anos 70, este grupo, liderado por Toni Moura, aventura-se nos caminhos do heavy e do rock progressivo, em moda. Tecnicamente competentes, afirmam-se na cena nortenha, na idade artesanal em que as bandas funcionavam à margem, da imprensa e, quase sempre, das editoras.
Alvaro Azevedo, ex-Pop Five - grupo que, ao contrário do Psico, gravou com êxito comercial - integra a primeira formação do Arte & Oficio e acompanhará Sérgio Castro por muitos anos, não só no Arte & Oficio como nos Trabalhadores do Comércio. Durante algum tempo, contarão com um violinista clássico que integra o grupo. Em duas palavras, trata-se de uma formação de veteranos formados na escola dura e com passagem por numerosos projetos que, passados à história os anos aventureiros do PREC, surgem no tempo certo com um projeto efectivamente profissional.
Ao longo do ano assinalam êxitos em palco, desde o Festival de São João da Madeira até um concerto na Praça Humberto Delgado, no Porto, onde tocam para 12 mil espectadores. A estreia no Sul, ocorre no fim do ano, no festival de Moscavide.
1977 - Já com outro veterano, Fernando Nascimento, nas guitarras, o grupo grava os primeiros singles: «Festival/Let Yourself Be» (Julho) e «The Little Story of Little Quibble» (Outubro), na Orfeu. Mas o ponto mais alto do ano é a primeira parte do concerto dos Can, perante um Pavilhão dos Desportos a rebentar pelas costuras. Garcez e companhia surpreendem pela energia e solidez, raramente ouvidas numa banda portuguesa. O público (e também a imprensa generalista) de Lisboa descobre-os efectivamente e rende-se à enorme capacidade de «bicho de palco» de Garcez. A bíblia rock nacional da época, a Música e Som, titula, pela pena de Jaime Fernandes: «Arte & Oficio, o êxito dos Can». Até a revista Família Cristã elogia «o som bem estruturado e sem os clichés que todos nós conhecemos em grupos portugueses». O rock directo do grupo estava de facto milhas à frente das tentativas menos conseguidas para apanhar, entre outros, o comboio do sinfónico.
Conseguem uma credibilidade que nenhuma banda rock até aí conhecera, ao demarcar-se das vãs tentativas de tocar «à Yes» ou «à Pink Floyd». «Marijuana» é outra das canções de proa da banda.
1978 - Novo êxito de palco, o elemento favorito deste grupo, nos festivais organizados pela Música e Som em Lisboa e no Porto. Este é o ano da edição de um novo single, para a editora de Arnaldo Trindade, «Come Hear the Band» em cujo lado B, no instrumental «Carcarejo da Galinha», o quinteto regressa às suas origens mais experimentais. O saxofonista Rui Cardoso, ex-Araripa, toca com o grupo nesse tema. Já consagrados como «o melhor grupo de rock português» continuam a investir nos concertos e adquirem um equipamento de palco que os distancia ainda mais da concorrência. Em Agosto, abre o Clube de Fãs Arte & Oficio. No fim do ano, tocam para três mil pessoas num festival na Madeira.
1979 - É o ano do esperado álbum de estreia, "Faces", que sai em Maio na Orfeu. «Follow Me Over via Dover», «Young Chiks», «Contraditction», «Lobster Society», «All We Have to Do», «Turn the Lights», «Sea of Monsters», «Trip», «Endless Way» e «Finally» são os temas do disco, que surge na continuidade lógica do sucesso acumulado ao longo dos três anos anteriores, que a entrada do pianista António Pinho, mais tarde António Pinho Vargas, oriundo do jazz, parece vir reforçar. O êxito, porém, está prestes a ser torpedeado por factores externos e internos à banda portuense. Se a saída de Serginho, membro fundador e segundo guitarrista, não é um grande abalo, o mesmo não se dirá da saída de António Garcez, cujas potencialidades vocais e de showman eram um dos trunfos essenciais do grupo.
Mas, ao fim de três anos de Arte & Oficio, o vocalista decide ir formar os Roxigénio com o guitarrista Filipe Mendes, uma lenda viva do rock português, que gravara o único disco dos Psico, já após a saída de Garcez e Sérgio Castro. Músico lendário, Filipe Mendes estava quase acabado, por diversas razões, quando surge ao lado de Garcez no Roxigénio, grupo cuja carreira não atingirá o impacte que todos pareciam adivinhar. O avanço do rock cantado em português, cuja guarda avançada, UHF, Rui Veloso e Heróis do Mar, tornaram subitamente vetustas as bandas que cantavam em inglês. O paradigma inverte-se do dia para a noite, mal cai o tabu de que o rock não podia ser cantado no idioma de Camões. Sérgio Castro, líder absoluto, após a saída de Garcez, continua fiel a esta ideia, mesmo se, no ano seguinte, decide fundar os Trabalhadores do Comércio onde, mais do que o português, explora o sotaque nortenho para produzir uma música positivamente hilariante.
O grupo de «Lima 5» é o primeiro em Portugal que se assume em absoluto como uma fun band. Sem Garcez, o Arte & Oficio continua a funcionar como quarteto. "Marijuana" é editado no Outono e levará o nome do grupo portuense a um festival a favor da liberalização das drogas leves em Londres. No mesmo Outono, uma nova primeira parte, desta vez para os Stranglers, em Cascais, corre de forma diametralmente oposta à da noite do Verão de 77 em que o grupo tinha feito a abertura dos Can.
Sem Garcez, a sala não reage do mesmo modo. O desastre acontece quando Serjão tenta um gimmick: muda de calças em palco e, perante a reação do público, prolonga o número até à exaustão, sem se aperceber que, atrás dele, António Pinho e Álvaro Azevedo decidem pura e simplesmente sair do palco! Sempre de costas para a banda, dá o tempo por duas vezes, obtendo como única resposta o silêncio. Quando se volta para trás, descobre que só lá está o guitarrista Fernando Nascimento... A força, porém, continua: a digressão nacional levará o grupo a 17 localidades do País.
1980 - O grupo volta a ter cinco elementos, com a entrada de André Sarbib, que tinha tocado, anos antes, no Quinteto Académico. Surgem as primeiras atuações fora de portas. Abrem para Joe Jackson em vários países do Sul da Europa e apresentam «Marijuana» no festival LCC, a favor da legalização da cannabis, realizado em Londres e onde Bob Marley faz um dos seus últimos concertos, antes de morrer em 11 de Maio de 1981. Já na PolyGram editam o segundo álbum, Danzas. Mas os ventos já não sopram de feição para estes músicos do Norte, 1980 é o ano de Cavalos de Corrida, de Ar de Rock e da afirmação do rock cantado em português.
Sérgio Castro e Alvaro Azevedo desdobram-se, com o «miúdo», João Luís, nos Trabalhadores do Comércio. Mas esse trabalho não demove Sérgio Castro das suas ideias. «É um profundo equívoco cantar rock em português», diz, numa entrevista a Manuel Dias, do Sele, em que justifica a opção seguida nos Trabalhadores do Comércio, pelo facto de este não ser um grupo de rock. O equívoco, porém, era de Sérgio Castro. O fim dos Arte & Oficio, bem como dos Tantra, marca o fim de uma era: a dos grupos tecnicistas e fiéis ao inglês, submergidos pela primeira vaga das bandas que adotaram o português e as correntes mais simples, do ponto de vista musical, surgidas desde 1976 na Europa.
O rock português emancipava-se e sacrificava aqueles que, como os Arte & Oficio, haviam de facto aberto os caminhos da popularidade e da credibilidade aos grupos portugueses.

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